O GRUPO É ABERTO, É GRATUITO E AS MULHERES POR MEIO DELE SÃO AJUDADAS E AJUDAM
“Quando um filho(a) perde seus pais, fica órfão(a).
Quando perdemos o marido ou a esposa, ficamos viúvos(as).
Quando uma mãe perde seu filho(a), não tem nome.”
Essa é a apresentação do Instituto Mães SemNome, localizado no Rio de Janeiro, presidido por Márcia Noleto e que tem como principal ideologia, o compartilhamento de experiências, de duras experiências.
O Instituto Mães SemNome oferece um trabalho conhecido como Grupo de Apoio Mútuo (GAM).
Coordenado pela psicóloga Judith Nemirovsky, o GAM tem como intuito oferecer apoio às mães enlutadas:
“O ser humano, por natureza, estabelece vínculos com seus semelhantes, buscando e compartilhando apoio e ajuda. Pensamos na necessidade de cada mãe enlutada de falar de seu momento de vida e poder vivenciar o luto e suas etapas. Nosso grupo busca o reaprender a viver com esta dor.”
A especialista explica que por meio do site do Instituto, é possível ver alguns vídeos que explicam sobre o Grupo de Apoio Mútuo, além de outros temas. A mulher que tiver interesse pode fazer cadastro na página do Instituto Mães SemNome e mandar um e-mail contando sobre quem perdeu, como e há quanto tempo. Depois disso, uma conversa é agendada com essa mulher para conhecê-la melhor e para explicar o funcionamento do grupo: “O grupo é aberto, o que significa que ela pode frequentar quando quiser, sem a obrigatoriedade de ir em determinados dias da semana. E é gratuito".
A pesquisa científica O luto pelo filho adulto sob a ótica das mães, esclarece que nos últimos anos, o processo de luto vem sendo estudado no Brasil a fim de que seja reconhecido em nível biopsicossocial — fenômeno que atinge a todos (indivíduos, famílias e sociedades). Fizeram parte da pesquisa, cinco mulheres com idade entre 50 e 75 anos, que haviam perdido filhos adultos pelo tempo mínimo de um ano. Após entrevistas realizadas com essas mulheres, percebeu-se que o suporte social que haviam recebido logo nos primeiros momentos após a perda de seus filhos, foi de extrema importância. Este “suporte social” envolveu familiares, amigos e grupos de apoio na internet.
“Dizem que quando perdemos nossos pais perdemos nosso passado. Quando perdemos os filhos perdemos não só o futuro, mas também o presente. Não somos mais a mesma pessoa. Mudamos. O que era importante deixa de ser. Não temos mais as mesmas prioridades. A dor inunda nosso dia a dia e por algum tempo, os outros amores ficam um pouco embotados. Fica um sentimento de solidão, como se esta dor fosse só nossa”, relata Judith Nemirovsky.
A psicóloga explica que o Grupo de Apoio Mútuo ajuda a mãe a perceber que não está sozinha e que outras pessoas experimentam esta mesma dor e dificuldade. Existe acolhimento e troca de experiências.
A coordenadora relembra que uma das participantes do GAM relatou que fazer parte do grupo a fez descobrir que a vida continua “vivível”, mesmo com tanta dor:
“Algumas questões são comuns: os filhos que ficam, o relacionamento com o marido, o fato de o mundo externo perder seu encanto, possíveis dificuldades na vida profissional e algum distanciamento afetivo dos demais. Perceber que isto é comum a todas ajuda a ressignificar as dificuldades.”
De acordo com artigo publicado pela BBC do Reino Unido, muitas pessoas experimentam um processo de luto profundo e de longa duração após a morte de um ente querido, outras enfrentam dificuldades que as levam à sensação de que a vida não tem mais sentido, mas ainda assim, todos esses processos (experiências humanas), não devem ser considerados como sintomas de uma doença mental.
A psicóloga esclarece que o luto não é uma doença que precisa de medicação e de que a dor é um processo natural, embora exista uma tendência à medicá-la:
“Mas ela sempre estará presente. O que todas querem é o cheiro, o abraço de seu filho de volta. E isto medicação alguma trará. Algumas participantes consultam psiquiatras e tomam remédios por algum tempo. Isto é individual. A coordenação do grupo, que é realizada por psicólogas, não medica.”
A especialista acrescenta que o próprio suporte do GAM produz efeitos terapêuticos e que algumas pessoas (dependendo do caso), são indicadas para a psicoterapia, para um trabalho mais elaborado.
Segundo pesquisa realizada pela Universidade Federal do Paraná, os rituais que envolvem a perda (velório e enterro), corroboram com a concretização da perda e possibilitam a expressão e simbolização do luto, mas de uns tempos para cá têm se tornado cada vez mais curtos, o que remete à ideia de que a dificuldade das pessoas para lidar com a morte e posterior luto, tem se tornado cada vez mais acentuada. Outro ponto destacado pela pesquisa é o da medicalização do luto e o da patologização da tristeza, que ao invés de auxiliar a pessoa a lidar com a dor da perda, impõe uma barreira para que o caminho de superação possa ser percorrido.
A coordenadora do GAM esclarece que embora a morte faça parte da vida, é um camuflado em nossa sociedade e vista pela maioria das pessoas como fracasso médico ou como castigo dos céus — o que dificulta a vivência do luto:
“Antigamente e ainda hoje, nas áreas rurais, a morte fazia parte do cotidiano das famílias. Acontecia. Aqui, nos grandes centros, ela é escondida e procuramos não falar sobre este assunto. Todos temos que ser jovens, saudáveis, bonitos e felizes. Não sobra espaço para a tristeza, que também é necessária.”
A psicóloga explica que é natural para algumas mulheres, a ideia de que superar o sofrimento pode ser como uma espécie de agressão à memória do filho(a), e que este pode ser um processo que dure muitos meses, já que o luto não tem tempo certo para acabar, assim como as suas etapas não possuem cronograma para acontecer. A coordenadora acrescenta que a superação dependerá de vários fatores e aos poucos, a vida e o “sabor” voltam para o dia a dia, grupos de apoio e a psicoterapia podem ajudar na compreensão dos sentimentos:
“Chorem. Permitam-se chorar. Precisamos viver esta tristeza toda para, lentamente, podermos voltar a sentir as outras emoções. Procurem ajuda com outras mães enlutadas que, apesar de tudo, podem ouvi-las e acolhê-las.”
Judith Nemirovsky – Psicóloga e Coordenadora do Grupo de Apoio Mútuo do Instituto Mães SemNome (GAM)
Fontes
O luto pelo filho adulto sob a ótica das mães. Realizado por: Ana Maria Rodrigues Franqueira; Andrea Seixas Magalhães; Terezinha Féres-Carneiro: www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-166X2015000300487
Grief and anxiety are not mental illnesses – Tristeza e ansidade não são doenças mentais. BBC UK: www.bbc.com/news/health-20986796
O luto de mães que perderam seus filhos: uma leitura psicanalítica. Universidade Federal do Paraná. Realizado por: Dhyone C. Shinemann: acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/35857/R%20-%20D%20-%20DHYONE%20C.%20SCHINEMANN.pdf?sequence=1&isAllowed=y